O envio de navios de guerra para a costa da Venezuela e a mobilização de tropas na fronteira com o México reacenderam o debate sobre até onde vai a estratégia dos Estados Unidos em sua guerra contra o narcotráfico. Analistas divergem se essas ações são apenas demonstrações de força ou um passo em direção a uma intervenção militar direta.
O episódio mais recente ocorreu após a divulgação de um vídeo que mostraria militares americanos atirando contra uma embarcação supostamente vinda da Venezuela com drogas rumo ao território americano. O presidente Donald Trump afirmou que “11 terroristas” foram mortos na operação, enquanto Caracas acusou Washington de manipular as imagens com inteligência artificial.
Segundo Tamara Lajtman, pesquisadora da Universidade de Buenos Aires, a política externa antidrogas dos EUA é antiga, mas Trump intensificou a narrativa que une migração, narcotráfico e terrorismo em um mesmo pacote de ameaças. O pesquisador mexicano Aníbal García reforça que se trata de uma diplomacia cada vez mais voltada ao uso da força, sustentada pela ideia de “narcoterrorismo”.
Além das operações militares, há medidas jurídicas e diplomáticas mais duras. O Departamento de Estado incluiu recentemente gangues e cartéis latino-americanos na lista de organizações terroristas estrangeiras e dobrou a recompensa pela captura de Nicolás Maduro, acusado de chefiar o chamado “Cartel de los Soles”. Trump também teria enviado um decreto ao Pentágono autorizando o uso da força no exterior contra cartéis.
Para Lajtman, a movimentação naval no Caribe funciona como um “mecanismo de pressão” para forçar concessões e tentar promover mudanças de regime, em especial na Venezuela. Ela lembra que as ações americanas reacendem tensões com México, Colômbia e Brasil, além de se inserirem em um contexto de disputa global com China e Rússia.
O pesquisador Aníbal García observa que não havia, desde a invasão do Panamá em 1989, tanta especulação sobre uma ação militar dos EUA na região. Segundo ele, além do combate às drogas, a política de Washington tem claros interesses estratégicos, como conter a presença chinesa e explorar reservas de petróleo venezuelanas.
Apesar do tom agressivo, García avalia que uma intervenção direta ainda não é provável, pois teria alto custo humano, político e econômico. “Esperamos que isso não aconteça, pelos impactos devastadores que teria, não apenas para a Venezuela, mas para toda a região”, afirmou, lembrando que intervenções anteriores dos EUA geraram instabilidade prolongada e reconfiguraram as relações internacionais nos países afetados.
Assim, especialistas apontam que, embora o risco de uma guerra aberta não possa ser descartado, o cenário mais provável continua sendo o da pressão militar simbólica, combinada com sanções econômicas e medidas jurídicas extraterritoriais.