A Casa de Jorge de Lima, em União dos Palmares

Com maceioagora // Profª Suely Correia

Todos sabem da importância da figura ilustre de Jorge de Lima para a sociedade, sua contribuição para literatura brasileira, para as artes e a história de Alagoas.

Breve biografia

Jorge Mateus de Lima nasceu em União dos Palmares (AL), no ano de 1895. Fez estudos secundários e iniciou o curso de medicina em Salvador, concluindo-o no Rio de Janeiro. Retornando ao estado natal logo depois, onde fez carreira em medicina e na política. Além de poeta, foi pintor, fotógrafo e ensaísta. Jorge morreu no Rio de Janeiro, no ano de 1953.

O município de União dos Palmares, conhecido como a “Terra do Quilombo” através do consagrado Zumbi, traz hoje seu nome e imagem do guerreiro em seu ônibus da prefeitura. Nele, são transportados estudantes e funcionários da região. Além disso, outdoors e placas sinalizando a cidade podem ser encontrados nas proximidades pela BR. Isso mostra um pouco do orgulho sentido por aqueles que habitam o município.

Em uma visita no dia 02 de fevereiro, na festa da Padroeira Santa Maria Madalena, encontrei a casa de Jorge de Lima com uma “nova roupa”, a arquitetura do prédio está modificada. Naquele momento, a decepção e o abuso do poder público me entristeceram. Pior que isso, são os cidadãos que conhecem a história daquela Casa e foram coniventes com a destruição daquele Patrimônio.

Casa esta, tão conhecida por mim que passei parte de minha infância e adolescência dentro dela, na época o meu tio era o proprietário. Lembro-me da casa de 1º andar, em frente à Igreja matriz e a praça principal da cidade, era linda, antiga, com adornos e artefatos do século XIX e com originalidade, como são buscados nos tombamentos de patrimônio histórico hoje.

Lembro da sacada que havia no casarão de frente a igreja, seus janelões e portas pesadas, pelos quais só com muita força conseguia-se fechá-las ou abri-las. Visualizava tudo que acontecia aos arredores e emocionava-me com a Festa de Sta Maria Madalena. Sentia-me como as mocinhas da época onde Jorge de Lima vivia por lá. Uma sala comprida, um salão no terrio enorme, a qual meu tio abriu uma livraria.

Como era gostoso andar no piso de madeira e descer e subir as escadarias de madeira, de tão maciço o som dos sapatos no sobe e desce pareciam música. Emoção não faltava. E quando chegava a hora de tomar banho a água era fria, o banheiro enorme no fundo da cozinha. Os quartos de meia parede, eram tão grossas que não dava pra se pendurar-se. Uma vida de realeza, viver e sentir aquilo tão diferente do que seria a arquitetura do século XX. Infelizmente tudo não passa de lembranças. Muitos não poderão sentir nada igual. Hoje esta tudo muito diferente.

Há alguns anos atrás, percebebi que o casarão estava se deteriorando, os homens do poder não se preocupavam com aquele “imóvel velho”. Então comentei com uma amiga museóloga, mostrei minha insatisfação e com seu auxílio foi criado um projeto de recuperação e reorganização do sobrado.

Como queríamos muito cuidar de um pedacinho do que é nosso, fomos procurar a secretaria de cultura na época, que pareceu interessada e prometeu marcar um encontro com o prefeito, encontro este que até hoje aguardamos. Agora o prédio pertence a Universidade Federal de Alagoas, onde o pró-memória é responsável.

Acredito que Patrimônio Histórico é tudo que se refere ao bem comum e significativo de uma sociedade seja no sentido estético, artístico, cultural, histórico e cientifico. Portanto, pertence ao povo e sua história, cabe aos poderes públicos preservá-los.

Resolvi verificar sobre a casa de Jorge de Lima em União. Abaixo encontram-se algumas informações oficiais, através do site da Secretaria Estadual de Cultura.

chamada:
livro de registro: Histórico
catálogo: Pró-Memória
cadastro: Bens Tombados
categoria: Registro de Edifícios e Monumentos Isolados Livro de Tombo nº 2
tipo: Arquitetura Civil
palavras-chaves: patrimônio arquitetônico – tombamento – histórico
obra: Casa onde residiu o Poeta Jorge de Lima
localidade: Rua Correia de Oliveira, nº 2 cidade e município de União dos Palmares, Estado de Alagoas. proprietário: Universidade Federa lde Alagoas-UFAL.
decreto: 5303 de 09/02/83
processo número: 543/83
caráter do tombamento: Anuência
nível: Nível Estadual

O que não podemos aceitar é que enquanto cidades de nosso país buscam valorizar sua cultura, seus patrimônios, sua história, Alagoas não quer viver as suas origens. Cidades se autodestroem, a população é cada vez mais miserável, a sociedade está cada vez mais pobre de educação e consciência do que é ser cidadão.

Alagoas não é só praia de belas águas e calmas. Temos história, temos uma pluralidade cultural que poucos estados possuem. Estão acabando com nosso cinturão verde. A natureza e as riquezas de Alagoas não é só da cor azul, é também verde, amarelo e branco. Não o verde do plantio da cana-de-açúcar que hoje predomina economicamente a região. O verde ecológico, da vida, dos seres humanos conscientes de sua existência e sabedoria. De intelectuais que passaram por aqui como Graciliano Ramos, Jorge de Lima, Artur Ramos, Maria Mariá, Deodoro da Fonseca, Floriano Peixoto, Jayme de Altavila e muitos outros.

Hoje, o chamado de Memorial Jorge de Lima, em que seus realizadores dizem tem como objetivo divulgar quem é Jorge de Lima, se contrapõe com a realidade vista. Foi retirada a sacada em que ficava de fronte a igreja, percebe-se também nos detalhes em branco o absurdo desse crime ao patrimônio do povo. Onde ao Secretaria de Cultura afirma que trata-se de um marco histórico. Já o prefeito acredita que a importância desse Memorial é um instrumento turístico.

Isso é preservar? Isto é ser guardião da história? É respeitar a cultura de seu povo? Será que a população de União não valoriza sua história? Será que não é culpa dos administradores seja federal, estadual e principalmente municipal, tamanha ignorância popular? Acredito que se realmente tivessem intenção real dos fatos para seus reais acontecimentos, este tipo de comentários não seriam tão absurdos.