 
                                    É o que mostram dados de uma plataforma internacional International Clinical Trials Registry Platform, que reúne cadastros de estudos desse tipo prestes a serem iniciados. Até o momento, cerca de 1,6 mil ensaios estão ativamente recrutando voluntários ou já completaram esta etapa de experimentos, seja com remédios, alguns tipos de vacinas e até terapias alternativas.
Os ensaios clínicos são exigidos por agências sanitárias para comprovação da segurança e eficácia de um tratamento, e seu posterior registro e comercialização.
Na América Latina, o Brasil é o país com mais ensaios clínicos relativos à covid-19 planejados ou em execução em seu território: 159.
No mundo, quem lidera são os Estados Unidos, com 532.
Diante dessas milhares de apostas, apresentamos quatro tratamentos experimentais contra a covid-19 que apresentaram avanços no último mês, no Brasil e no mundo.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) deu sinal verde, na última quarta-feira (24/3), ao início de testes clínicos com um soro desenvolvido pelo instituto Butantan, vinculado ao governo estadual de São Paulo.
O soro, um líquido injetável rico em anticorpos contra o coronavírus, é destinado a pessoas já infectadas e busca frear o agravamento da doença, impedindo por exemplo que ela ataque o pulmão.
Os testes com cobaias tiveram resultados "extremamente" efetivos, segundo o Butantan.
Ainda não há data determinada para início, mas os testes com pessoas devem começar em breve, segundo contou à BBC News Brasil Ana Marisa Chudzinski Tavassi, bioquímica e diretora do Centro de Desenvolvimento e Inovação do instituto.
Também está sendo definido o número de voluntários, mas pela natureza do tratamento, a abrangência menor do que em testes com vacinas. Elas são planejadas para serem aplicadas na população geral e têm função preventiva - diferente de tratarem alguém já infectado, como faz o soro.
O Butantan é responsável pela produção e fornecimento de outros soros para todo o país, como contra a raiva e venenos de cobras. No tratamento desenvolvido contra a nova doença, o coronavírus foi isolado de um paciente, multiplicado, inativado (para não desencadear uma infecção) e aplicado em cavalos em uma dose segura para não adoecerem.
Os animais funcionam como "fábricas" de anticorpos, produzidos em contato com o vírus e depois retirados para compor o soro aplicável em humanos.

CRÉDITO,REUTERS/AMANDA PEROBELLI
Testes de soro do Butantan com pessoas devem começar em breve, diz diretora do Centro de Desenvolvimento e Inovação do instituto.
"México, Costa Rica, entre outros países, produziram soros. A Argentina já tem um soro com uso autorizado para pacientes de modo geral e com resultados muito bons", aponta Chudzinski.
"Estes soros foram feitos para (atacar) um pedaço da proteína spike do vírus. A nossa diferença é que trabalhamos com o vírus inteiro. Isso pode ser uma vantagem em relação a variantes que estão por aí, porque as grandes variações estão acontecendo justamente na proteína spike."
Spike é como se chama a proteína que se encaixa nas células humanas para promover a infecção pelo coronavírus.
"Já trabalhamos in vitro com as variantes P.1 e P.2. Também vimos, nos testes com cobaias, uma clara redução da carga viral e a preservação do pulmão um dia depois do tratamento", diz a diretora do Butantan, acrescentando que ainda não há estudo publicado com os resultados.
Os ensaios clínicos vão verificar, na fase 1, se o soro é seguro para uso; na fase 2, qual seria a dosagem ideal; e na fase 3, se ele é eficaz em um grande número de pessoas.
Outro tratamento em estudo que avançou para a primeira fase dos testes clínicos foi um remédio de uso oral que está sendo desenvolvido pela farmacêutica Pfizer. A empresa anunciou no dia 23 que os experimentos com pacientes foram iniciados nos Estados Unidos.
Segundo a empresa, o antiviral mostrou uma ação "potente" em testes in vitro no laboratório e é projetado para ser usado aos primeiros sintomas de covid-19.
O medicamento da Pfizer é do tipo inibidor de protease — uma enzima essencial para o vírus se multiplicar.
"A protease é crítica para o vírus se desenvolver, e os medicamentos direcionados a ela cortam alguns dos primeiros estágios da infecção — impedindo que o vírus se replique", explicou à BBC News na Inglaterra o virologista Stephen Griffin, da Universidade de Leeds.
Inibidores de protease já são usados contra os vírus HIV e da hepatite C. Inclusive, um desses medicamentos, o lopinavir-ritonavir, originalmente usado contra o HIV, foi incluído em um grande projeto da Organização Mundial da Saúde (OMS) para testar tratamentos considerados promissores pela entidade contra a covid-19.
Entretanto, alguns meses depois do início do projeto, chamado Solidarity, a OMS anunciou que interrompeu os estudos com o lopinavir-ritonavir uma vez que as pesquisas até ali mostraram que o tratamento tinha pouco ou nenhum efeito na redução da mortalidade de pessoas hospitalizadas.
Por ora, a primeira fase de ensaios clínicos anunciada pela Pfizer vai avaliar principalmente a segurança do medicamento, acompanhando eventuais efeitos adversos e alterações em exames.

CRÉDITO,GETTY IMAGES
No último mês, foram anunciados resultados de fases 2 e até 3 de ensaios clínicos relativos à covid-19
Já na fase 3, envolvendo mais de 4,5 mil participantes, os testes com um coquetel desenvolvido pela farmacêutica Roche tiveram bons resultados anunciados também no último dia 23.
O coquetel, uma combinação das substâncias casirivimab e imdevimab com aplicação intravenosa, configura um tipo de tratamento chamado de anticorpos monoclonais — quando anticorpos de uma pessoa que se recuperou da doença são selecionados e copiados em laboratório.
Os voluntários eram pessoas infectadas pelo coronavírus, não hospitalizadas, mas sob risco de agravamento da doença.
De acordo com a companhia, o coquetel reduziu em 70% o risco de hospitalização e morte, na comparação com o placebo (um tratamento inócuo). Este era o principal objetivo a ser verificado pelo estudo.
Mas objetivos secundários também tiveram bons resultados, como a redução da duração dos sintomas de 14 para 10 dias. Os efeitos adversos se mostraram estatisticamente pouco signficantes, em 1% dos pacientes.
Há vários outros experimentos em curso com o casirivimab e imdevimab, incluindo no projeto Recovery, um conjunto de testes em larga escala no Reino Unidos com potenciais tratamentos para covid-19.
Em um comunicado, a Roche afirmou que irá compartilhar os resultados com agências sanitárias americanas e europeias, indicando sua intenção de ver o produto registrado e comercializado. A farmacêutica também pretende divulgar os dados em uma publicação científica.
No início de março, no dia 6, as farmacêuticas MSD e Ridgeback apresentaram resultados preliminares de um ensaio clínico em fase 2 com o antiviral oral molnupiravir, envolvendo 202 pessoas infectadas com o coronavírus nos Estados Unidos e não hospitalizadas.
Segundo comunicado, após o quinto dia de tratamento, a carga viral foi reduzida entre aqueles que receberam tratamento. Além disso, os efeitos adversos foram considerados irrelevantes e não relacionados ao medicamento. Detalhes e mais resultados da fase 2, incluindo os objetivos principais, serão divulgados em breve, de acordo com o consórcio.
Outros ensaios de fase 2 e 3 com o antiviral também estão sendo realizados.
O molnupiravir inibe a replicação de vírus de RNA como o SARS-CoV-2, e teve bons resultados em laboratório não só com este patógeno, mas com outros como o SARS-CoV-1 e MERS.
Bbc Brasil