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20/10/2011 10:20:49

20 anos depois, Papódromo vira estribaria de cavalos

20 anos depois, Papódromo vira estribaria de cavalos
Papódromo em Maceió 20 anos depois

Vinte anos depois da visita de Karol Wojtyla ao Brasil, o local construído para receber o papa João Paulo II em Alagoas está completamente abandonado, na orla lagunar de Maceió. O Papódromo - como é conhecido o local onde o papa rezou a missa em 19 de outubro de 1991, virou estribaria de cavalos, depósito de lixo e reduto de usuários de drogas.

Os moradores da região dizem que já fizeram abaixo-assinado, já realizaram protesto e manifestações, para cobrar dos órgãos públicos a recuperação do Papódromo, mas até agora nem a prefeitura, nem o governo do Estado, nem a União demonstrou interesse pela área.

“É um jogo de empurra enorme, a prefeitura diz que não é com ela, o governo do Estado diz que a área é da União e ninguém faz nada para recuperar um local santo como esse”, reclama o carroceiro alagoano José Antônio Luiz de Sousa, 42 anos.

“O lugar onde a gente mora é um solo sagrado; é um lugar santo, onde o papa João Paulo II pisou, quando esteve nem Alagoas. Infelizmente está abandonado há muitos anos pelas autoridades. Entra governo, sai governo e ninguém faz nada por nós”, acrescenta o pescador Anilson Souza da Silva, 51 anos, que é amigo e vizinho do carroceiro.

Quando foi construído, na época do governo Geraldo Bulhões, e com recursos liberados pelo então presidente Fernando Collor, em 1991, o Papódromo custou uma fortuna. A obra foi superfaturada e a empresa Sérvia Engenharia, responsável pela construção do Papódromo, ainda recebeu parte dos pagamentos atrasados em Letras do Tesouro do Estado, emitidas durante o governo Divaldo Suruagy, sob o pretexto de pagar precatórios inexistentes.

Como o rombo dos títulos públicos foi incluído na dívida do Estado com União, que hoje já passa dos R$ 7 bilhões, os recursos gastos na construção do Papódromo até hoje continuam sendo cobrados dos alagoanos. Alagoas paga por ano mais de R$ 400 milhões à União, só com serviço da dívida do Estado. O governador Teotônio Vilela Filho (PSDB) vem tentando uma renegociação com o governo federal mas enfrenta problemas, pelo histórico da dívida e porque qualquer tratamento diferenciado provoca a reação de outros estados da federação, que também devem à Nação.

Não existe rua

“Quando alguém pergunta o meu endereço eu digo que moro por trás do Papódromo, número 007, mas essa rua onde fica o meu barraco não existe no cadastro da prefeitura de Maceió. Por isso, a gente tem dificuldade de matricular os filhos na escola pública e no programa ‘Bolsa Família’”, afirma o carroceiro. As crianças brincam ao redor do que restou da estrutura metálica do Papódromo. Muitas não frequentam sala de aula.

“A escola mais próxima que tinha aqui da favela, a Escola Estadual Tarciso de Jesus, foi fechada por falta de condições do prédio, interditado por problemas da fiação. No inverno as paredes davam choque. Com isso, os alunos foram transferidos para outra escola no bairro do Farol, mas a distância é grande e nem sempre os ônibus escolares que eles prometeram para os alunos daqui estão disponíveis ou funcionando. Isso tudo dificultou o acesso das crianças às escolas”, comentou José Antônio.

O carroceiro lembra com carinho da visita do Papa a Maceió. “Eu morava no Conjunto Virgem dos Pobre, quando inauguraram o Papódromo, na visita do papa a Alagoas”, conta José Antônio. "Era um dia de sábado, com uma verdadeira multidão vindo de todos os lados, para ver o papa", acrescenta .

“Depois da festa da visita do papa, eu vinha namorar com a minha esposa nos bancos do Papódromo. Isso aqui era uma maravilha, era tudo arrumadinho, tudo muito bem cuidado. Hoje está abandonado, ninguém toma conta”, lamenta o carroceiro.

Ele disse ainda que na gestão da prefeita Kátia Born (PSB), que administrou Maceió até o final de 2004, e do ex-governador Ronaldo Lessa (PDT), que governou Alagoas de 1999 a 2006, ainda fizeram alguns reparos no Papódromo, mas depois disso a obra foi completamente abandonada.

O secretário de comunicação da Prefeitura de Maceió, jornalista Marcelo Firmino, disse que a obra foi construída pelo governo federal e cedida ao Estado. “A obra é da união e foi cedida para ser administrada pelo governo do Estado. Portanto, o abandono não é responsabilidade da prefeitura”, afirmou o secretário, lamentando o estado deplorável em que o local se encontra.

Com relação à limpeza da área, Firmino diz que é um serviço da prefeitura e que vez sendo feito, mas infelizmente os moradores não colaborar, usando a base do altar onde o papa rezou a missa como depósito de lixo e entulhos.

A Secretaria Estadual de Infraesturura de Alagoas (Seinfra) informou que não é responsável pelo Papódromo, que a obra pertence a União, mas que vem realizando um trabalho de reurbanização da orla lagunar, voltado para retirada das famílias dos barracos e a entrega de casas e apartamentos. Segundo a assessoria da Seinfra 1.181 casas que estão sendo construídas para as famílias cadastradas em quatro favelas da orla lagunar.

“Já foram entregues 821 casas na região do conjunto Eustáquio Gomes e 240 apartamentos às famílias que estão sendo retiradas dos barracos da orla lagunar”, informou a assessoria da Seínfra."A prefeitura também construiu mais 500 casas entregues às famílias dessas favelas. Portanto, são cerca de 1600 casas e apartamentos na região do Dique estrada, para pescadores e marisqueiras retirados dos barracos de quatro favelas da orla lagunar: Torre, Muvuca, Mundaú e Sururu de Capote", acrescentou a assessoria da Seinfra.

A Secretaria assegurou ainda que o projeto de reurbanização da orla lagunar, orçado em R$ 30 milhões, contempla os moradores da favela por trás do Papódromo, cuja área é conhecida como Muvuca e é considerada uma das mais perigosas da região. Apesar de morar muitos trabalhadores, pescadores, marisqueiras, carroceiros e desempregados, a presença do tráfico é constante. O receio dos pais de família é de perderem os filhos para o tráfico. "Sem escola, os meninos ficam sem ter o que fazer, e o tráfico leva", comenta José Amaro da Silva, que é carroceiro e trabalha com produtos reciclados.

Por trás dos toscos barracos construídos com restos de materiais de construções, cobertos com telhas de brasilite ou lona de plástico, fica a Lagoa Mundaú, que a poucos quilômetros dali deságua no mar, na divisa de Maceió com Marechal Deodoro, a primeira capital do Estado, berço do 'Proclamador da República'.

Antes de desaguar no mar, a imensa lagoa recebe as águas do rio Mundaú, que vem da Zona da Mata em direção ao oceano. Recebe também os esgotos de boa parte das cidades ribeirinhas. A região é um verdadeiro estuário, mas vem sendo seriamente degradado pela poluição, pela especulação imobiliária e a ocupação desordenada das margens da lagoa, seja para o abrigo das lanchas dos ricos ou para os barracos dos desvalidos.

Os moradores não querem que o local do Papódromo se transforme num terminal do trem VLT, como estão dizendo por ai. Apesar do aniversário de 20 anos da obra ter passado despercebido, mas as reclamações continuam. As demandas são muitas. Os moradores cobrarem das autoridades melhorias para o local que serviu de altar para o papa João Paulo II, que está para ser canonizado pela Igreja Católica. Só falta a comprovação de um milagre para que Karol Wojtyla se torne santo.

Pelo menos não vai ser por falta de reza, já que apesar do Papódromo estar todo destruído, as devotas de Nossa Senhora Virgem dos Pobres se reúnem sempre, pelo menos uma vez na semana, ao pé da imagem da santa para rezar e pedir melhores dias para aquela comunidade, paz no mundo e mais solidariedade.

 

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ricardo rodrigues