De acordo com a mais recente análise do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as famílias sob a chefia de indivíduos negros ou pardos representam uma vasta maioria das residências afetadas pela insegurança alimentar grave no Brasil.
Em 2024, cerca de 1,4 milhão de lares liderados por pardos e aproximadamente 424 mil por pretos estavam em situação de fome severa, correspondendo a aproximadamente 73,8% de todas as casas com risco alimentar grave no país, totalizando 2,5 milhões de domicílios.
Essa estatística demonstra que, para cada quatro residências com problemas de alimentação, quase três são comandadas por pessoas de cor preta ou parda. Tais conclusões fazem parte de uma edição especial da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, divulgada nesta sexta-feira (10) pelo IBGE, que investiga a condição de segurança alimentar nos lares brasileiros. Para a realização do estudo, o IBGE percorreu diversas regiões do país, visitando famílias e realizando entrevistas sobre os hábitos alimentares dos últimos 90 dias.
Os casos considerados de insegurança alimentar severa envolvem relatos de redução ou ausência de alimentos essenciais, incluindo o abastecimento das crianças, o que faz com que a fome seja uma realidade constante nessas residências. Os dados revelam uma desigualdade racial significativa: pretos e pardos representam 45,1% dos cerca de 78,3 milhões de lares existentes no país, enquanto eles comandam 41,5% do total de lares e são responsáveis por 24,4% dos endereços em que a fome foi registrada em 2024. Além disso, o levantamento aponta que as mulheres assumem papel majoritário na chefia dessas residências.
Elas lideram 51,8% dos lares brasileiros, e em 57,6% dos domicílios com insegurança alimentar grave, a responsável é uma mulher. Quando considerados todos os graus de insegurança — leve, moderada ou grave — esse percentual sobe para 59,9%, indicando que aproximadamente seis em cada dez lares sob o comando feminino enfrentam dificuldades relacionadas à alimentação. A insegurança de nível leve indica preocupação ou dúvida sobre a disponibilidade de alimentos, enquanto a moderada refere-se à redução ou ausência de comida para adultos.
Segundo Maria Lucia Vieira, pesquisadora do IBGE, esses números evidenciam a vulnerabilidade de grupos como pretos, pardos e mulheres em relação a renda e acesso a recursos básicos. Ela reforça que: “Estamos lidando com domicílios de rendimento frequentemente mais baixo”. Outro aspecto destacado na pesquisa é que 71,9% das famílias em insegurança alimentar grave ou moderada têm renda mensal de até um salário mínimo por pessoa.
Além de fatores econômicos, o estudo revela que as crianças são as mais afetadas pela insegurança alimentar. Entre os menores de 4 anos, 3,3% vivem em lares com fome, percentual que aumenta para 3,8% na faixa de 5 a 17 anos.
Para os adultos até 49 anos, o índice cai para 2,8%, enquanto para pessoas entre 50 e 64 anos, chega a 3,3%. A menor incidência é encontrada em idosos de 65 anos ou mais, com 2,3%. Segundo Maria Lucia, a maior vulnerabilidade infantil é parcialmente atribuída às regiões Norte e Nordeste, que apresentam os menores índices de segurança alimentar geral.
Esses locais ainda possuem taxas de fecundidade mais elevadas, contribuindo para a maior incidência de insegurança entre os jovens.