Um cirurgião ortopedista da organização Humanitária Médicos Sem Fronteiras, François Jourdel, detalha os horrores que testemunhou em Gaza após uma recente missão aos hospitais locais. Em entrevista exclusiva à RFI, ele compartilha suas impressões sobre o colapso social, a devastação e a dramática condição dos residentes palestinos.
Data de publicação: 17/09/2025 às 18:29 - Atualização: 17/09/2025 às 18:30
Na semana passada, Israel lançou uma nova operação na Cidade de Gaza, intensificando ainda mais a crise humanitária, apesar dos apelos internacionais pelo cessar-fogo. Jourdel, que retornou recentemente de uma segunda visita aos hospitais do território palestino, relata a situação de desespero que os habitantes enfrentam.
Ele descreve a entrada no enclave como uma experiência chocante, destacando uma região que virou uma área de total destruição. "Ao atravessarmos a fronteira, ficamos impressionados ao ver uma terra arrasada, onde o Exército israelense demoliu todos os edifícios, deixando apenas fragmentos de paredes e destroços dispersos", explica.
O médico revela que o impacto emocional ao rever pessoas que conheceu há dois anos é profundo. "Observamos sinais evidentes de fadiga, emagrecimento extremo no rosto e nos corpos dessas pessoas. Provavelmente, elas também sofrem com exaustão e desnutrição", acrescenta.
Jourdel afirma que a situação de segurança na Faixa de Gaza é precária, confirmando relatos de jornalistas que permanecem na região. "Não há mais áreas verdadeiramente seguras. Vivemos com a ameaça constante de bombas caindo próximo às nossas residências, até mesmo em zonas destinadas às ações humanitárias", afirma.
Para ele, a rotina diária dos moradores da Gaza se resume a uma batalha incessante pela sobrevivência. Devido à destruição de suas casas, famílias inteiras muitas vezes dormem em espaços de apenas 20 metros quadrados, sobrepostos uns aos outros. Ele ressalta que, na maioria dos casos, vivem em tendas, enfrentando ratos, moscas e a ausência de saneamento básico, o que favorece a proliferação de vermes.
Entre os pacientes atendidos nesta última missão, Jourdel relata ter encontrado ferimentos causados por balas, bombas e drones. "Muitos corpos estão mutilados, com ferimentos enormes, membros fraturados, alguns completamente abertos, com perda de sensibilidade nas pernas e braços, além de pessoas esmagadas por escombros de construções destruídas. Em muitos casos, somos obrigados a realizar amputações", explica.
Após convivência e atendimento à população local, o especialista expressa sentimentos de empatia, tristeza e impotência perante uma situação que se agravou ao longo de quase dois anos.
"Compartilhamos essa dor profunda e gostaríamos de oferecer algum conforto aos habitantes ao partirmos, dizendo que tudo vai melhorar e que logo os veremos sorrindo novamente", afirma. "Porém, há poucas esperanças visíveis, o que torna a despedida extremamente dolorosa, pois ninguém sabe qual será o futuro deles, nem mesmo eles."
Jourdel também manifesta seu desejo de retornar à Gaza para continuar ajudando. "É fundamental fazer isso. As pessoas merecem uma chance de recuperação", declara. "Embora mantenha algum contato pelo WhatsApp, a situação no local é ainda mais angustiante, marcada por lágrimas, sangue e dor diária", conclui, visivelmente emocionado.