Os trabalhadores com carteira assinada que recebem R$ 5 mil mensais serão os mais favorecidos pela proposta de alteração no Imposto de Renda em análise no Congresso. De acordo com cálculos do diretor tributário da Confirp Contabilidade, Welinton Mota, esse grupo deixará de pagar cerca de R$ 313 de IR retido na fonte a cada mês, o que representa uma economia anual de R$ 4.067, incluindo o 13º salário. Segundo ele, isso equivale quase a um salário extra no ano, mas os ganhos vão diminuindo gradualmente até rendimentos de R$ 7.350. Acima desse valor, não há mudanças.
A Câmara dos Deputados aprovou o regime de urgência para o projeto, que já passou por uma comissão especial e pode ser votado diretamente em plenário. A proposta prevê um desconto variável que zera o IR para rendas de até R$ 5 mil e reduz progressivamente o benefício até R$ 7 mil, segundo o governo, ou R$ 7,35 mil, conforme o relator Arthur Lira (PP-AL). Quem ultrapassar esse limite não será beneficiado. Lira afirmou que a medida deve atingir 500 mil brasileiros e que busca manter a neutralidade fiscal. Para valer em 2026, precisa da aprovação do Congresso.
Com a mudança, cerca de 10 milhões de contribuintes ficariam isentos do IR em 2026, ano eleitoral. O Ministério da Fazenda estima que mais de 26 milhões de declarantes (65%) não pagariam o imposto e, considerando toda a população, 87% estariam livres do IRPF.
Veja a simulação dos ganhos:
Renda mensal – Ganho por mês – Ganho anual
R$ 3,4 mil – R$ 27,30 – R$ 354,89
R$ 4 mil – R$ 114,76 – R$ 1.491,89
R$ 5 mil – R$ 312,89 – R$ 4.067,57
R$ 5,5 mil – R$ 246,32 – R$ 3.202,19
R$ 6 mil – R$ 179,75 – R$ 2.336,75
R$ 6,5 mil – R$ 113,18 – R$ 1.471,31
R$ 7 mil – R$ 46,60 – R$ 605,86
R$ 7,35 mil – zero – zero
(Fonte: Confirp Contabilidade)
A proposta do governo amplia a faixa de isenção de R$ 3.036 para R$ 5 mil mensais e cria um benefício parcial para quem recebe até R$ 7 mil. Para compensar a queda na arrecadação, pretende tributar quem ganha acima de R$ 50 mil por mês, equivalente a R$ 600 mil ao ano. A cobrança de dividendos, porém, terá limites, para não ultrapassar 34% nas empresas e 45% nas instituições financeiras.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defendeu que a medida corrige distorções no sistema tributário. Segundo ele, hoje o “morador da cobertura não paga condomínio e o zelador paga pelo mesmo prédio”, numa metáfora para desigualdade tributária. No entanto, dados do IBGE mostram que apenas 32% dos trabalhadores, aqueles que recebem acima de dois salários mínimos, seriam diretamente beneficiados. Isso significa que, na prática, a maior parte do impacto atinge a classe média e média alta, já que quem ganha mais de R$ 6 mil está entre os 10% mais ricos do país.
Especialistas avaliam que a mudança pode gerar concentração de benefícios entre faixas mais altas de renda, enquanto os mais pobres já são isentos. Para alguns analistas, seria como cobrar mais dos moradores da cobertura para transferir renda aos andares intermediários do prédio. O governo nega caráter eleitoral e afirma que a proposta foi desenhada para garantir equilíbrio fiscal.
Entidades como o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) e a Oxfam Brasil consideram que a medida avança, mas ainda é insuficiente, defendendo uma reforma tributária mais justa e inclusiva. Já técnicos do Ipea apontam que a proposta falha ao não elevar a tributação sobre lucros e dividendos, prática comum em países desenvolvidos. O economista Sérgio Gobetti destacou que, se essa taxação fosse mais robusta, poderia gerar até R$ 100 bilhões por ano, recursos que poderiam reduzir a alta carga sobre o consumo, que hoje pesa proporcionalmente mais sobre a população de baixa renda.