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Polícia
06/09/2025 20:00:00

A ofensiva policial contra os 'cogumelos mágicos' que pode levar tema ao STF

A ofensiva policial contra os 'cogumelos mágicos' que pode levar tema ao STF

Na quinta-feira (4), policiais de sete Estados e do Distrito Federal deflagraram a operação Psicose, que mirou a produção e comercialização dos chamados cogumelos "mágicos", usados tanto em contextos recreativos quanto em tratamentos médicos alternativos. A ação, liderada pela Polícia Civil do DF, resultou em ao menos 10 prisões, cumprimento de 20 mandados de busca e apreensão e bloqueio de R$ 30 milhões em contas dos investigados. Segundo o delegado Waldek Cavalcante, os suspeitos também utilizavam empresas do ramo alimentício para lavar dinheiro.

A ofensiva reacende a polêmica jurídica em torno do tema. O principal cogumelo investigado, o Psilocybe cubensis, não está listado entre os fungos proibidos pela Anvisa. No entanto, suas substâncias ativas — a psilocina e a psilocibina — aparecem na lista F2 da Portaria 344/1998, que regula psicotrópicos de uso vetado no Brasil. Essa distinção alimenta a disputa entre defensores e autoridades: para advogados e vendedores, não haveria proibição expressa do cogumelo em si, mas apenas das substâncias isoladas; já a Justiça tem enquadrado o comércio como tráfico de drogas.

Em agosto, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou a condenação de um homem preso em Brasília em 2023 pela venda de cogumelos. O relator, ministro Carlos Cini Marchionatti, entendeu que a presença de substâncias psicoativas basta para configurar o crime, ainda que o fungo não esteja citado nominalmente nas listas da Anvisa. A decisão consolidou o entendimento de que cultivo e venda exigem autorização legal, o que estimulou a operação em todo o país.

Para a defesa, o caso deve ser levado ao Supremo Tribunal Federal (STF). O advogado Fernando Vasconcelos afirma que a discussão ultrapassa o processo individual e toca em questões de saúde pública, já que em países como Estados Unidos e Reino Unido há estudos sobre o uso da psilocibina contra depressão e dependência química. Ele representa Fábio Hoff dos Santos, condenado por vender cogumelos pela internet com termos como "viagem intensa" e até uma "calculadora mágica" para dosagem. Preso em flagrante em 2023, Hoff cumpriu parte da pena em regime aberto e busca agora questionar no STF se é legítimo criminalizar o comércio e o consumo do produto.

A polêmica se apoia também em interpretações jurídicas distintas. Enquanto a lei brasileira proíbe “plantas” e “vegetais” usados para obtenção de drogas, advogados argumentam que os cogumelos são fungos, pertencentes a outro reino biológico, e não poderiam ser enquadrados na norma penal. Já o delegado Cavalcante sustenta que não há mais brechas: “Está proibido em primeira, segunda instância e no STJ. Os argumentos são falhos”, disse, citando inclusive casos de mortes por uso excessivo e a substituição do LSD pelos cogumelos em festas no Brasil.

Especialistas como o advogado Emilio Figueiredo e a professora Fernanda Vilares, da FGV, observam que o tema segue aberto a interpretações devido à falta de clareza normativa. Para Figueiredo, o recente posicionamento do STJ enfraquece a tese da legalidade, mas o debate tende a ganhar novos contornos caso o STF seja provocado. Enquanto isso, pesquisas no exterior indicam possíveis benefícios terapêuticos no tratamento de depressão, ansiedade e estresse pós-traumático, embora cientistas ressaltem que as evidências ainda são limitadas.

No centro da disputa estão diferentes visões sobre liberdade individual, saúde pública e política de drogas. Para advogados, mesmo o uso recreativo não deveria ser criminalizado, pois se trata de uma experiência de alteração de consciência comparável a outras práticas não proibidas. Para as autoridades, porém, o risco de abuso, mortes e a ausência de regulamentação tornam o comércio ilegal. Se aceito pelo STF, o caso poderá definir o futuro da legalidade ou da criminalização dos chamados "cogumelos mágicos" no Brasil.