Um decreto do Governo do Amazonas, que reduz de 80% para 50% a área de reserva legal em imóveis rurais com passivos ambientais, está sendo interpretado por especialistas como uma possível anistia a desmatamentos ilegais. O governo estadual nega essa leitura e afirma que a medida tem como objetivo apenas regulamentar a recomposição de áreas já degradadas.
Assinado pelo governador Wilson Lima (União) em 6 de agosto, em Apuí, o decreto nº 52.216/2025 permite que propriedades situadas em municípios da Amazônia Legal, com mais de 50% do território ocupado por unidades de conservação e terras indígenas homologadas, possam reduzir o percentual de reserva legal exigido. A condição é que os donos dos imóveis se comprometam a recompor a floresta, seja por regeneração natural ou compensação, e que estejam inscritos no Cadastro Ambiental Rural (CAR).
O ponto central da polêmica é o parágrafo único do Artigo 2º, que restringe a redução para fins de recomposição, mas especifica que ela “não se aplica a imóveis que apresentarem conversão de novas áreas ou novos desmatamentos a partir da data de publicação do Decreto”. Para Marcelo Elvira, secretário-executivo do Observatório do Código Florestal, essa redação abre margem para que quem desmatou ilegalmente até 5 de agosto seja beneficiado. Ele avalia que, na prática, o texto pode perdoar atos ilícitos: “No fim, acaba sendo uma anistia. Você arrisca premiar quem agiu contra a lei”, afirma.
Outro ponto levantado por especialistas é que a legislação federal só permite a redução da reserva legal em estados que já tenham o Zoneamento Econômico-Ecológico (ZEE) aprovado. O engenheiro ambiental Luiz Andrade lembra que o Amazonas ainda não possui esse instrumento e que, além disso, o percentual de áreas legalmente protegidas no estado é de cerca de 54,8%, abaixo dos 65% exigidos pelo Código Florestal.
O governo, por sua vez, afirma que o decreto apenas regulamenta dispositivos já previstos no Código Florestal e na legislação estadual. A medida, segundo a gestão, não flexibiliza regras e só se aplica a imóveis com passivos ambientais anteriores à regularização. Também reforça que o desmatamento sem autorização continua ilegal e que propriedades com cobertura florestal preservada seguem obrigadas a manter 80% de reserva legal.
O texto foi elaborado com a participação da Secretaria de Meio Ambiente, da Procuradoria-Geral e de representantes de produtores do sul do Amazonas. O governador Wilson Lima destacou que a medida visa permitir que agricultores antes embargados possam se legalizar e que o estado seguirá com o processo de Zoneamento Econômico-Ecológico, começando por Apuí.