No leste da República Democrática do Congo, a mina de Rubaya, atualmente sob domínio dos rebeldes do M23, é uma peça-chave na produção global de telefones celulares. A BBC teve acesso ao local, onde mais de 10 mil trabalhadores realizam atividades diariamente, escavando o solo em busca de coltan, um minério essencial para a fabricação de componentes eletrônicos.
Por todo o terreno acidentado, mineiros trabalham sem descanso. Enquanto uns cavam com pás em fossos profundos, outros carregam pesados sacos de rochas até os pontos de lavagem, onde o material é separado manualmente para a extração do tântalo. Patrice Musafiri, nomeado pelo M23 para supervisionar a área, afirma que o local não permite a presença de homens armados e garante que a segurança trouxe uma relativa tranquilidade para os trabalhadores.
O mineiro Peter Osiasi relata os desafios do ofício. “Lá embaixo, o calor é intenso e há risco de gases perigosos. Às vezes, é preciso bombear ar frio para continuar o trabalho”, diz ele. Ainda assim, afirma ter conseguido mudar de vida com a mineração. “Guardei dinheiro, me casei, tenho filhos. Foi duro, mas valeu a pena.”
A mina se espalha por uma faixa de terra nos morros Masisi, na província de Kivu do Norte, cerca de 60 quilômetros de Goma, próxima à fronteira com Ruanda. Com 15% da produção mundial de coltan e metade das reservas congolesas do minério, Rubaya atrai atenção internacional e já passou pelas mãos de diferentes grupos armados ao longo dos anos.
A visita da equipe da BBC coincidiu com um cessar-fogo firmado entre Congo e Ruanda em Washington. O M23, contudo, não participou do acordo. Formado majoritariamente por membros da etnia tutsi, o grupo expandiu seu controle desde janeiro, tomando cidades estratégicas e aeroportos no leste do país. Apesar das acusações da ONU sobre o apoio de Ruanda ao M23, o governo ruandês nega qualquer envolvimento.
Segundo Musafiri, o M23 organizou a administração da mina, criando um departamento próprio para fiscalizar a segurança e intermediar conflitos. “Se há risco em algum túnel, as pessoas são retiradas. Muitos vêm aqui para trabalhar ou comprar minério, que depois é revendido em um grande mercado em Goma”, explica.
Relatório recente da ONU revela que o M23 arrecada centenas de milhares de dólares por mês com a cobrança de taxas sobre o coltan, sendo boa parte do dinheiro encaminhada a Ruanda. As partes envolvidas negam.
Osiasi confirma que houve melhorias nas condições de trabalho, mas o salário permanece muito baixo. “A paz nos ajuda, mas ganhamos pouco”, lamenta.
A ofensiva do M23 coincidiu com o segundo mandato de Donald Trump, que expressou interesse em recursos minerais congoleses. “Estamos garantindo muitos direitos minerais do Congo para os EUA”, declarou o ex-presidente. Autoridades congolesas veem nessa aproximação uma chance de atrair investimentos, especialmente dos Estados Unidos, que poderiam competir com a predominância chinesa no setor.
Akramm Tumsifu, analista político, acredita que os recursos naturais estão sendo usados como moeda de troca para apoio militar americano. Segundo ele, empresas dos EUA já demonstram interesse, mas qualquer investimento deverá promover desenvolvimento local, como escolas, hospitais e melhoria salarial.
Musafiri reforça que só serão bem-vindos investidores que contribuam para a comunidade. “O importante é que tragam benefícios ao povo e melhorem o pagamento diário dos trabalhadores.”
Apesar da abundância de recursos, as comunidades mineradoras vivem com pouca infraestrutura. Estradas acessíveis sequer existem em boa parte da região.
Há também um processo paralelo de mediação, liderado pelo Catar, que envolve o governo congolês e grupos armados. O M23 integra a Aliança do Rio Congo, coalizão que afirma que o recente acordo de paz ignorou as raízes do conflito. O grupo diz ter se levantado em armas para defender os direitos da minoria tutsi no país.
Enquanto políticos e líderes rebeldes discutem caminhos para o fim do conflito, os trabalhadores da mina esperam apenas por paz e melhores condições de vida. “Meu apelo é para que nossos líderes mantenham a paz e que os donos da mina aumentem nosso salário”, conclui Osiasi, prestes a voltar para mais uma jornada sob o solo.