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Acidente
02/08/2025 02:00:00

Gaza: quais são os cinco estágios que levam à fome?

Gaza: quais são os cinco estágios que levam à fome?

As condições humanitárias na Faixa de Gaza continuam a se agravar, com quase um terço da população passando dias inteiros sem acesso a alimentos, segundo o Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas. O Ministério da Saúde de Gaza, administrado pelo Hamas, relatou que mais sete pessoas morreram por desnutrição nas últimas 24 horas, elevando para 154 o total de vítimas desde outubro de 2023, incluindo 89 crianças.

Apesar de o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ter reconhecido a existência de uma “fome real” no território, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, nega a situação. Ainda assim, Israel autorizou uma “pausa tática local” para facilitar a entrada de ajuda humanitária. O coordenador da ONU para ajuda humanitária, Tom Fletcher, alertou que o volume de alimentos necessário para combater a crise é imenso.

Na cidade de Gaza, uma em cada cinco crianças já apresenta sinais de desnutrição, e esse número cresce diariamente, segundo a Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados Palestinos (Unrwa). A ONU relata que muitas pessoas estão sendo internadas em estado de exaustão por falta de comida, e outras chegam a desmaiar nas ruas.

Apesar do cenário alarmante, a ONU ainda não declarou oficialmente a existência de fome na região. No entanto, a Classificação Integrada de Fases de Segurança Alimentar (CIF) afirma que Gaza enfrenta um risco crítico de catástrofe alimentar.

Entenda os cinco estágios que levam à fome

A CIF é o padrão internacional utilizado para avaliar a gravidade da insegurança alimentar. O nível mais extremo, Fase 5 – Fome, é caracterizado por três critérios simultâneos:

  • Ao menos 20% das famílias sem acesso a alimentos de forma extrema;

  • Mínimo de 30% das crianças com desnutrição aguda grave;

  • Duas mortes diárias por fome entre cada 10 mil adultos ou quatro entre 10 mil crianças.

De acordo com um relatório da CIF publicado em 12 de maio, toda a população de Gaza já se encontra entre a Fase 3 (crise) e níveis mais graves. A estimativa é que cerca de 469,5 mil pessoas estarão em situação de Fase 5 entre maio e setembro de 2025.

Em situações assim, a ONU costuma declarar oficialmente a ocorrência de fome, geralmente em conjunto com o governo do território afetado e agências humanitárias internacionais.

O que a fome faz ao corpo humano?

A fome é resultado da privação contínua de alimentos, levando à ausência de calorias suficientes para manter as funções vitais. Inicialmente, o corpo consome glicose proveniente dos alimentos e, na falta deles, passa a usar o glicogênio armazenado no fígado e músculos. Quando esse estoque se esgota, o organismo recorre à gordura e, depois, aos músculos para gerar energia.

Isso provoca uma série de reações, incluindo contração de órgãos como pulmões, estômago e órgãos reprodutores, e pode gerar alucinações, depressão e ansiedade. Muitas pessoas acabam morrendo não de fome diretamente, mas de infecções causadas por um sistema imunológico debilitado.

Segundo a pesquisadora Charlotte Wright, da Universidade de Glasgow, nem todos os casos evoluem da mesma forma. Crianças previamente saudáveis ainda podem ter alguma energia para se recuperar se houver alimentação adequada, enquanto outras podem não resistir.

Efeitos da desnutrição em crianças e bebês

A desnutrição durante a infância pode causar efeitos permanentes, como atraso no crescimento e prejuízos no desenvolvimento cognitivo. A Organização Mundial da Saúde define o nanismo como o resultado de desnutrição combinada com infecções frequentes e falta de estímulo psicossocial.

Crianças com esse quadro costumam ter estatura muito abaixo do esperado para a idade. Além disso, mães desnutridas têm dificuldade para produzir leite e correm riscos como anemia, pré-eclâmpsia e hemorragias, além de darem à luz bebês com baixo peso, segundo a Unicef e a Fundação das Nações Unidas.

O médico Nuradeen Alibaba, da ONG Médicos Sem Fronteiras, explica que o nanismo é irreversível e que essas crianças também podem desenvolver problemas permanentes de aprendizado e fragilidade óssea, o que as torna mais propensas a fraturas no futuro. Em meninas, a desnutrição pode levar até à infertilidade.

Como tratar a desnutrição?

A professora Charlotte Wright explica que o combate à crise passa pela distribuição urgente de alimentos em Gaza, com foco em produtos terapêuticos e nutritivos direcionados especialmente às crianças e suas mães. Ela ressalta que a amamentação continua sendo a forma mais segura de nutrição para bebês, mas isso exige que as mães também sejam bem alimentadas.

A médica Smitha Mundasad, da BBC News Árabe, alerta que tratar a desnutrição grave exige cuidado médico. Em casos extremos, a pessoa pode não conseguir mais engolir e precisar de alimentação formulada em hospitais, junto com tratamento para infecções. Alimentar uma pessoa desnutrida de forma errada ou muito rápida também pode agravar seu estado.

A crise na Faixa de Gaza, segundo especialistas, requer mais do que a simples entrada de alimentos. É preciso garantir que eles cheguem aos mais vulneráveis, com suporte médico e infraestrutura para o tratamento das complicações causadas pela fome.