Com uma emenda ao Código Penal, a República Tcheca passou a equiparar legalmente o comunismo ao nazismo. A nova legislação prevê pena de até cinco anos de prisão para quem fundar, apoiar ou promover movimentos que defendam qualquer uma dessas ideologias. A mudança, que entrará em vigor a partir de 1º de janeiro de 2026, foi sancionada pelo presidente Petr Pavel no fim de julho e gerou polêmica no país e críticas do governo russo.
A iniciativa partiu do movimento civil "Novembro Ainda Não Acabou", liderado pelo senador Martin Mejstrik, ex-ativista estudantil da Revolução de Veludo, que em 1989 marcou a transição pacífica da Tchecoslováquia de um regime comunista para a democracia. O projeto contou com o apoio do Instituto para o Estudo de Regimes Totalitários (USTR) e foi aprovado pelo parlamento com o respaldo da coalizão governista pró-europeia liderada pelo primeiro-ministro Petr Fiala.
Segundo o artigo 403 da nova redação do Código Penal, serão punidas com reclusão de um a cinco anos as pessoas que "fundarem, apoiarem ou promoverem movimentos nazistas, comunistas ou outros que atentem contra os direitos humanos, incitem ao ódio racial, religioso, nacional, étnico ou de classe, ou contra qualquer grupo de pessoas". O pesquisador Kamil Nedvedicky, do USTR, defendeu a mudança como necessária para eliminar uma desigualdade jurídica entre ideologias que, segundo ele, têm históricos semelhantes de repressão.
A medida coloca a República Tcheca ao lado de países como Polônia, Hungria, Ucrânia e os Bálticos, que já aprovaram legislações semelhantes contra o comunismo. Apesar disso, a decisão repercutiu negativamente na oposição de esquerda, especialmente no Partido Comunista da Boêmia e Morávia (KSCM), que teme ser banido com base na nova lei. O partido, herdeiro do antigo Partido Comunista da Tchecoslováquia, perdeu espaço nas eleições de 2021, mas recuperou parte de sua influência ao eleger representantes no Parlamento Europeu em 2024, integrando a coligação Stacilo! (Basta!). Pesquisas apontam que essa aliança poderá voltar ao parlamento nacional nas eleições de outubro.
A principal candidata do grupo é a eurodeputada Katerina Konecna, líder do KSCM, que classificou a nova legislação como uma tentativa do governo de calar opositores. Segundo ela, a coalizão governista age para silenciar críticas, enquanto ignora problemas reais enfrentados pela população, como o alto custo de vida. Konecna também apontou a ironia de a lei ter sido assinada por Petr Pavel, ex-membro do Partido Comunista antes de 1989. O presidente, por sua vez, já reconheceu o erro de seu passado político e afirmou que seus 30 anos de serviço público em defesa da democracia representam um pedido de desculpas à sociedade.
A reação da Rússia foi imediata. O Ministério das Relações Exteriores do país acusou o governo tcheco de seguir uma agenda revanchista de direita e de distorcer a história, em linha com políticas de Bruxelas. O presidente da Duma russa, Vyacheslav Volodin, foi além e afirmou que a medida tem como objetivo atacar diretamente a Rússia, comparando o país atual à antiga União Soviética, cujo regime comunista teria sido igualado ao fascismo pela nova lei tcheca.
A mudança, que reabre antigas feridas do passado totalitário da Tchecoslováquia, promete ser um dos temas centrais do debate político nas próximas eleições legislativas, reacendendo discussões sobre liberdade de expressão, memória histórica e os limites da democracia frente a ideologias radicais.