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Atualidade
19/07/2025 00:00:00

De avião a cacau: América Latina não consegue substituir o Brasil após tarifas de Trump

De avião a cacau: América Latina não consegue substituir o Brasil após tarifas de Trump

Aumento dos impostos poderia abrir espaço para exportação de commodities, mas a sofisticação industrial de empresas brasileiras deixa pouco espaço para a substituição de produtos como aeronaves, aço ou celulose.

Os países da América Latina enfrentam desafios para competir com a escala produtiva e a capacidade logística do Brasil.

Após o anúncio do aumento de tarifas nos Estados Unidos, que poderiam entrar em vigor em 1º de agosto, a América Latina vislumbra uma possível reconfiguração no comércio, com alguns países tentando capturar parte da demanda dos EUA por matérias-primas como café ou carne. No entanto, a sofisticação industrial do Brasil, especialmente na produção de aeronaves, aço e celulose, torna difícil substituir os produtos que representam grande parte do comércio exterior com os EUA.

Embora os países da região, como Argentina, Colômbia, Uruguai, Equador e países da América Central, possam fornecer algumas dessas matérias-primas, há desafios significativos. De acordo com Helena Pinto de Mello, professora de economia da PUC-SP, os produtos do Brasil têm um padrão de qualidade e uma imagem de marca estabelecida, o que torna a competição mais difícil para seus concorrentes. Apesar disso, a grande capacidade do Brasil de fornecer grandes volumes a preços competitivos continua a ser uma vantagem.

Em um relatório citado pela Reuters, o Ministério da Fazenda do Brasil afirmou que as tarifas terão pouco impacto no crescimento do país, uma vez que as commodities representam a maior parte das exportações brasileiras para os Estados Unidos, e esses produtos podem ser redirecionados para outros mercados e regiões. As exportações brasileiras para os EUA incluem petróleo, café e carne bovina, além de produtos industriais como aeronaves, aço e celulose.

Os Estados Unidos, embora sejam grandes produtores de produtos agrícolas como soja, milho e algodão, têm pouca dependência das exportações brasileiras. Para produtos como café, que o Brasil lidera na produção mundial, os analistas observam que substituições por outros países exigiriam um planejamento demorado, e os EUA provavelmente terão que pagar mais pelos produtos.

No caso das aeronaves, a Embraer, terceira maior fabricante mundial, pode enfrentar custos adicionais significativos devido à tarifa de 50% que Trump está considerando. O impacto nos custos de fabricação de aeronaves seria de cerca de US$ 9 milhões por unidade exportada para os Estados Unidos, já que o país é o principal mercado da Embraer, responsável por 45% das exportações de aeronaves comerciais e 70% das exportações de jatos executivos da empresa.

Outro setor afetado seria o de celulose, onde o Brasil, especialmente com a Suzano, é um dos maiores produtores mundiais. Embora a Suzano tenha a capacidade de redirecionar suas exportações para outros mercados, como a Europa, os EUA ainda dependem fortemente das exportações brasileiras, somando cerca de US$ 1,5 bilhão em celulose exportada em 2024.

No setor do café, a Colômbia e outros países da América Central poderiam ver algum aumento na demanda, mas não há capacidade de suprir toda a necessidade dos EUA. A competição será desafiadora, com a Colômbia destacando-se na produção de café arábica suave lavado, mas o mercado será limitado pelos baixos estoques globais e a dependência dos EUA do café brasileiro.

A carne brasileira também apresenta desafios para os países do Cone Sul, como Argentina e Uruguai, que, apesar de serem grandes produtores, não têm capacidade suficiente para substituir a produção brasileira para os EUA. Mesmo que a Argentina possa tentar posicionar-se como substituta, essa mudança poderia gerar tensões políticas, principalmente no contexto de Mercosul.

Em termos de cacau, o Brasil tem um mercado interno robusto, o que limita suas exportações para outros países, enquanto países como o Equador, um dos maiores produtores mundiais, podem se beneficiar parcialmente da alta das tarifas impostas aos produtos brasileiros. Contudo, o impacto será limitado, já que o volume de cacau exportado pelo Brasil é muito menor comparado ao dos outros grandes produtores da região.

O cenário, portanto, não aponta para uma simples substituição dos produtos brasileiros, mas para um período de ajustes complexos tanto para os países latino-americanos quanto para os Estados Unidos.