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Comportamento
16/07/2025 12:00:00

Gay e católico praticante: como fiéis LGBT conciliam a fé com a orientação sexual

Gay e católico praticante: como fiéis LGBT conciliam a fé com a orientação sexual

Pamella Barbosa Silva, uma mulher de 37 anos, só conseguiu se assumir como homossexual dois anos atrás. Nascida em Ceres, Goiás, ela encontrou sua vocação religiosa aos 10 anos, durante uma brincadeira de esconde-esconde, quando entrou em uma igreja católica e ficou encantada com o ambiente. Ela decidiu, então, abandonar a fé protestante de sua família e se tornar católica. Porém, o que ela não sabia era que essa escolha resultaria em 27 anos de repressão à sua sexualidade.

Durante sua adolescência, Pamella se envolveu ativamente com a Renovação Carismática Católica (RCC), um movimento conservador e pentecostal do catolicismo, que, em várias ocasiões, a levou a pregar contra a homossexualidade. "Eu me via como uma pessoa suja, pecadora, errada. Não podia ser quem eu era. Isso me trouxe grandes transtornos emocionais e psicológicos", conta. Por 27 anos, ela escondeu sua sexualidade, acreditando que suas inclinações eram pecaminosas e que ela deveria renunciar à sua vida afetiva para ser "santa" aos olhos da igreja.

Para muitos católicos LGBTQIA+, a experiência dentro da Igreja Católica é marcada por um conflito interno constante, pois a doutrina religiosa ainda considera a homossexualidade como algo contrário à "lei natural" e ao plano de Deus. Segundo o Catecismo da Igreja Católica, a homossexualidade é descrita como "depravação" e "desordem", e os homossexuais são chamados a viver em castidade.

No entanto, alguns progressos têm sido feitos. O padre jesuíta James Martin, consultor do Vaticano sobre questões LGBT, afirma que, embora a Bíblia tenha passagens que condenam a homossexualidade, ela também enfatiza a necessidade de acolher as pessoas excluídas, como os LGBTQIA+. Ele lembra que a Igreja, em sua essência, deve ser um espaço de respeito e compaixão, como exemplificado pelos ensinamentos do Papa Francisco. Em 2022, o Papa autorizou a publicação de um documento que oficializou a bênção de "casais irregulares", incluindo os casais do mesmo sexo, embora o casamento religioso para essas uniões ainda não seja permitido.

Pamella, que vive um relacionamento com Érika Oliveira Guerreiro Reis, também católica, compartilha que, embora o casamento religioso não seja possível para casais homossexuais, ela e sua noiva planejam celebrar seu compromisso de maneira espiritual no casamento civil. "Embora não possamos casar na Igreja, queremos viver nossa união com a presença de Deus", explica.

Luis Rosalles, coordenador da Rede Nacional de Grupos Católicos LGBT, reforça a ideia de que a fé e a orientação sexual podem coexistir. A Rede, fundada em 2014, apoia fiéis LGBT, oferecendo um ambiente seguro para que possam viver sua fé sem medo de discriminação. Para Rosalles, embora o casamento homossexual não seja aceito pela Igreja, isso não significa que os homossexuais não possam viver sua fé de maneira plena e acolhedora, desde que sigam a proposta de castidade.

Camila da Silva Santos e Souza Valentim, secretária da Rede, relata suas próprias dificuldades enquanto crescia dentro da RCC, onde a homossexualidade era tratada como algo pecaminoso. Ela, que se identificou como bissexual desde jovem, afirma que sua experiência na Igreja foi mais fácil por estar casada com um homem. "Como sou casada com um homem, minha vivência dentro da Igreja é mais confortável do que a de muitos colegas católicos LGBT", diz Camila.

Andrea Rossati Farias Chaves, mulher transexual e ativista de direitos humanos, compartilha a dor de ser marginalizada dentro da Igreja, embora tenha encontrado consolo em sua fé. Ela optou pela vida celibatária para se alinhar com os ensinamentos católicos, embora ainda sinta a falta de acolhimento por parte de alguns fiéis. "Não preciso da aceitação de todos, mas seria bom se a Igreja me acolhesse completamente", diz Andrea.

A Renovação Carismática Católica mantém sua postura contra a homossexualidade. Seus documentos afirmam que as práticas homossexuais são "intrinsecamente desordenadas" e "contrárias à lei natural", e são expressamente desaprovadas pela doutrina oficial. No entanto, os líderes da RCC alegam que as pessoas com "tendências homossexuais" devem ser acolhidas com respeito, embora afirmem que as uniões homoafetivas não devem ser legitimadas civilmente nem reconhecidas pela Igreja.

Apesar das dificuldades impostas pela Igreja Católica, Pamella e outros católicos LGBT continuam a lutar por seu lugar dentro da fé. Eles esperam que, com o tempo, a Igreja acolha mais plenamente as pessoas LGBT, permitindo-lhes viver sua sexualidade sem medo ou preconceito. "Sonho com o dia em que a Igreja me acolha, me ame e me respeite como sou", diz Pamella.

Embora haja algumas vozes progressistas dentro da Igreja, como o Papa Francisco, que recentemente autorizou bênçãos pastorais a casais homoafetivos, muitos acreditam que mudanças significativas na doutrina da Igreja, como a aceitação do casamento gay, ainda estão distantes. O teólogo Brendo Silva acredita que, embora algumas paróquias aceitem pessoas LGBT, os avanços são limitados e muitas vezes os religiosos que apoiam a comunidade LGBT enfrentam perseguições internas.

Cauê Ribeiro Fogaça, padre e pesquisador de teologia, afirma que a Igreja Católica ainda tem muito a aprender sobre como acolher pessoas LGBT de maneira plena, sem discriminação ou preconceito. "O importante é que a comunidade católica, como um todo, mostre respeito e amor por aqueles que estão à margem", conclui.

Apesar de ser um caminho longo e cheio de desafios, as pessoas LGBT dentro da Igreja Católica seguem sua fé, acreditando que, eventualmente, a Igreja será capaz de acolhê-las de maneira plena e sem discriminação.