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Saúde
12/07/2025 08:00:00

Perigo para os jovens: o risco por trás da moda de misturar energético com álcool

Perigo para os jovens: o risco por trás da moda de misturar energético com álcool

Mesmo com os alertas nos rótulos e as advertências dos especialistas, a combinação de bebidas energéticas com álcool continua a ser amplamente consumida entre jovens no Brasil. A prática, comum em festas, bares e casas noturnas, preocupa profissionais da saúde por estar associada a riscos cardíacos, comportamentais e ao aumento do consumo excessivo de álcool.

As bebidas energéticas, que se popularizaram entre as décadas de 1980 e 2000, são facilmente encontradas no comércio nacional. No entanto, seu uso associado a bebidas alcoólicas tem crescido, apesar de a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) exigir que os rótulos informem que essa mistura não é recomendada. Para especialistas, porém, o aviso impresso nas embalagens tem efeito limitado.

Relatos de jovens mostram os impactos do consumo. Rafael*, de 17 anos, contou que sentia desidratação, agitação e dificuldade para relaxar após consumir a mistura. Já Matheus Reginato, de 19, afirma que nunca teve reações adversas, mas reconhece que os riscos são pouco divulgados. Julia Barbosa, de 18 anos, sente palpitações cardíacas ao ingerir a combinação, mas continua consumindo por considerar o gosto mais agradável que o das bebidas alcoólicas puras.

Pais também expressam preocupação. A empresária Daniella Wassouf, mãe de dois jovens, teme pelos efeitos da mistura, especialmente por já ter histórico familiar de problemas cardíacos associados ao consumo de energético. Ela afirma que, embora oriente os filhos a evitar a combinação, o ambiente social favorece o acesso e o consumo.

O ator Rafael Zulu revelou que precisou ser internado após consumir a mistura em grande quantidade. Diagnosticado com fibrilação atrial, ele ficou hospitalizado por quatro dias e relatou que nunca havia tido problemas cardíacos antes.

A Anvisa exige desde 2005 que os fabricantes informem no rótulo sobre os perigos da associação com álcool, uma medida motivada por discussões internacionais sobre o aumento de comportamentos de risco e intoxicação quando os dois produtos são consumidos juntos. Isso ocorre porque o efeito estimulante da cafeína pode mascarar os sinais de embriaguez, levando ao consumo maior de álcool.

Segundo Arthur Guerra, psiquiatra do Hospital Sírio Libanês, a mistura pode provocar alterações na região do cérebro responsável pela tomada de decisões, o que é ainda mais perigoso em jovens, cujo cérebro segue em desenvolvimento até cerca dos 25 anos. Ele ressalta que a prática, conhecida como binge drinking, é especialmente nociva para esse grupo.

O cardiologista Fernando Torres, da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), reforça que há risco real de arritmias, aumento da pressão arterial, infartos e até morte, especialmente para pessoas com predisposição a problemas cardíacos. Ele alerta que muitos jovens, por não fazerem check-ups regularmente, desconhecem essas condições.

Para os especialistas, os avisos nos rótulos são insuficientes. Arthur Guerra defende campanhas nacionais de conscientização com linguagem acessível, uso de dados científicos e participação de influenciadores e artistas que dialoguem com o público jovem. Fernando Torres propõe ações mais amplas voltadas à prevenção de doenças cardiovasculares e promoção de hábitos saudáveis.

Embora os perigos sejam reconhecidos, não há no Brasil uma regulamentação que proíba a venda conjunta de bebidas alcoólicas e energéticas. Em Brasília, por exemplo, é comum encontrar estabelecimentos que oferecem combos promocionais, como vodca acompanhada de energéticos, o que torna a combinação ainda mais atrativa e acessível. Em alguns casos, o energético é vendido como presente ao aniversariante, incentivando o consumo.

A responsabilização dos bares e casas de show divide opiniões. Para Matheus, a decisão de consumir é pessoal, mas Júlia acredita que os estabelecimentos deveriam ter maior compromisso com a conscientização. Rafael sugere que uma solução só virá com um consenso entre todos os envolvidos no comércio de bebidas.

A Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e de Bebidas Não Alcoólicas (ABIR) afirma que os energéticos são seguros, regulados em mais de 175 países e vendidos com rótulos informativos. A Associação Brasileira de Bebidas (Abrabe) declarou que não incentiva a combinação com álcool e que as empresas associadas seguem padrões de comunicação responsável. A Abrasel, que representa bares e restaurantes, informa que não realiza campanhas específicas sobre o tema, mas orienta seus associados a seguir as normas da Anvisa.

Procuradas, algumas fabricantes adotaram posturas diferentes. A Red Bull disse não comentar ações internas, enquanto a Baly destacou que oferece versões sem álcool com sabores típicos de festas. A Monster não respondeu aos questionamentos.

Apesar da crescente preocupação médica e dos relatos de efeitos adversos, não há projetos de lei em andamento que proíbam a venda conjunta de álcool e energético. O debate permanece aberto, enquanto os especialistas pedem ações mais incisivas para proteger especialmente o público jovem, que continua sendo o principal alvo dessa prática.