Uma pesquisa feita por médicos intensivistas, que são especialistas em pacientes em estado crítico, analisou o impacto de “eventos adversos”, os erros hospitalares (entenda abaixo), nos leitos de duas unidades de terapia intensiva (UTI) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, na capital paulista.
Os resultados foram publicados em janeiro deste ano na revista "Journal of Critical Care". Em um ano, de outubro de 2017 a outubro de 2018, 510 internações foram monitoradas. O grupo de pesquisadores acompanhou os pacientes do começo ao fim do atendimento (alta hospitalar, transferência ou morte) para entender se o motivo da ida para a UTI tinha ou não associação com algum erro médico ou hospitalar, chamado tecnicamente como “evento adverso”.
O que foi considerado "evento adverso"? Incluiu, além de erros médicos, danos à saúde decorrentes da ação de outros profissionais, falta de insumos, perfurações acidentais, objetos deixados dentro dos corpos, erros de dosagens, líquidos contaminados, quedas, procedimentos malsucedidos e outros processos inadequados em um ambiente hospitalar inseguro.
No cenário da época, as duas UTIs adultas tinham um total de 19 leitos, em que um enfermeiro e um médico cuidavam de cinco pacientes e havia um técnico de enfermagem para cada dois internados.
Os principais pontos observados pelos pesquisadores:
Os pacientes admitidos na UTI após o evento adverso geraram exames adicionais em 88,7% das vezes, 75,8% deles receberam medicações adicionais e 48,3% precisaram de procedimentos adicionais.
O estudo concluiu que os eventos adversos foram um motivo relevante para internações nas UTIs. “A elevada taxa de evitabilidade descrita reforça que os programas de qualidade e segurança poderiam funcionar como uma ferramenta para otimizar recursos escassos”, disseram no texto.
Todos os que participaram da pesquisa são médicos intensivistas do HC: Rodolpho Augusto de Moura Pedro, Bruno Adler Maccagnan Pinheiro Besen, Pedro Vitale Mendes, Augusto Cezar Marins Gomes, Marcelo Ticianelli de Carvalho, Luiz Marcelo Sá Malbouisson, Marcelo Parque e Leandro Utino Taniguchi.
Quatro motivos principais foram encontrados como possíveis causadores dos eventos adversos:
Eventos considerados como não preveníveis
Segundo apurado pelo g1, entre as internações nas UTIs por eventos considerados não preveníveis estavam casos relacionados a efeitos colaterais graves após medicações prescritas mesmo com indicação e dosagem corretas, como hepatite por medicamentos, reações alérgicas graves, sangramento abdominal e até mesmo cerebral.
Eventos considerados como preveníveis
Entre os eventos considerados como preveníveis entre pacientes que precisaram de UTI, a maioria esteve relacionada com infecções hospitalares, complicações com procedimentos médicos invasivos e efeitos colaterais da prescrição desnecessária ou excessiva de medicamentos.
Em nota ao g1, a Secretaria de Estado da Saúde (SES) informou que, de janeiro a novembro de 2023, nas unidades estaduais, foram registrados 11 eventos adversos e queixas técnicas referentes aos atendimentos ambulatoriais prestados à população.
Em todo o ano de 2022, a pasta afirmou que nenhum evento adverso foi registrado. E, em 2021, apenas um foi registrado.
Em outubro de 2023, o Boletim Saúde da População Negra, projeto do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS) e do Instituto Çarê, apontou que entre 2010 e 2021 pessoas negras foram mais vítimas de erros médicos devido a acidentes ou negligência profissional no Brasil.
O estudo levantou que foram registradas 66.496 internações por causa de eventos adversos. Pela média, foram 15 casos por dia, no país.
O g1 solicitou um posicionamento ao Hospital das Clínicas a respeito dos resultados da pesquisa, mas não obteve resposta até a última atualização desta reportagem.
g1