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03/12/2007 00:00:00

Alagoas


Alagoas
Numa dessas reportagens em que o repórter não tem certeza de que conseguirá fazê-la; não tem certeza se a pessoa a ser entrevistada, e que está sumida da mídia há 10 anos, aceitará dar a entrevista, chegamos ao coronel José de Azevedo Amaral, ex-secretário de Segurança Pública e uma figura sempre lembrada – e, por isso mesmo, com fervorosos defensores e opositores.

Viajamos até Batalha torcendo para dar certo; a entrevista era a capa de lançamento do semanário ESSE. O companheiro Vasni Soares, cinegrafista, fotógrafo e o motorista guiou o carro pela estrada de barro cortando a fazenda do coronel Amaral em Batalha. Ufa! Conseguimos. Satisfeitos, o Vasni sugeriu parar o carro à beira do Rio Ipanema para a gente comemorar com um grito de satisfação.

Reproduzimos a entrevista com o coronel Amaral, que foi realizada há três meses, mas oportuna, pertinente e atual – seja para quem defende sua volta ao comando da segurança pública, seja para quem se opõe.

Vamos à entrevista:

- O senhor criou a Polícia Civil, a Academia de Polícia, o Manicômio Judiciário; o senhor comandou por vários anos a segurança pública em Alagoas, o que o senhor sugere para conter a violência no Estado?

Coronel Amaral – Em primeiro lugar devemos aumentar o efetivo da Polícia Militar e da Polícia Civil; em segundo lugar, salvo melhor juízo, deve-se reativar as subdelegacias distritais porque o policial tem mais contato com a comunidade e torna-se mais fácil combater a criminalidade conhecendo-se os problemas dessa comunidade.

-A integração com a comunidade é fundamental para a polícia?

Coronel Amaral – É fundamental sim porque a comunidade tem de participar, tem de ajudar ao secretário de Segurança, tem de ajudar a polícia a combater a criminalidade. A participação da comunidade é fundamental sob todos os aspectos. O que não é possível é continuar como está; é continuar com essa situação, com o secretário de Segurança lutando para resolver o problema ser o apoio necessário. Mas, é preciso ver também que existem duas outras questões: a primeira questão é financeira e a segunda questão é que somente resolvendo-se a questão financeira, é que se pode resolver outra questão fundamental que é transporte e o combate efetivo à ciminalidade.

- E o Serviço de Inteligência?

Coronel Amaral – É 100% necessário. O Serviço de Inteligência é tão importante quanto o combate à criminalidade em si. O Serviço de Inteligência pode prevenir o crime, pode orientar a autoridade sobre o crime e isso é fundamental também nesse processo. A Polícia Científica também é importante para se desvendar os crimes.

- O senhor considera que a polícia alagoana está desaparelhada?

Coronel Amaral – Totalmente. Está desaparelhada e desmotivada. É necessário haver a reciclagem, aumentar o efetivo tanto da Polícia Militar como da Polícia Civil. Eu acho que os nossos policiais já estão fazendo demais, acho que eles (policiais) estão fazendo muito mais do que poderiam fazer diante da falta de condições, dos baixos salários, do desaparelhamento total. A Polícia Militar tem condições de resolver esses problemas ( ausência de policiamento ostensivo) e o que falta é contingente.

-A Polícia Civil que o senhor criou não é esta Polícia Civil que está aí?

Coronel Amaral – Não digo que não é esta policiais que criei. Naquela época conseguíamos a duras penas apoio financeiro para nossas atividades. Para você ter uma idéia, quando fui secretário havia em todos os povoados um serviço de rádio, de modo que a Secretaria de Segurança Pública estava permanentemente em contato com os pontos mais distantes do Estado, nós sabíamos o que estava se passando no Estado. Eu criei a Academia de Polícia, mandei vários delegados fazerem cursos de aperfeiçoamento fora do Estado; eu trouxe até a SWAT (tropa de elite da polícia dos Estados Unidos) para ministrar cursos na Academia.

-E hoje?

Coronel Amaral – Hoje não sei. Estou afastado, não posso dizer que não existe porque não estou vivendo a realidade do Estado. Hoje sou apenas um pequeno fazendeiro. O que sabemos é que muitos policiais moram em morros, nas favelas, convivendo com a marginalidade, expondo-se à marginalidade, expondo a sua família aos riscos e é preciso ter uma formação moral muito rígida para não se envolver.

- Por falar em fazendeiro, é mais fácil cuidar de boi ou de gente?

Coronel Amaral – É mais difícil cuidar de boi, principalmente nessa nossa região sujeita à seca.

- Mas, o ser humano também dá trabalho...

Coronel Amaral – Dá sim, dá muito trabalho, principalmente quando o índice de criminalidade está elevado, quando deixamos a criminalidade avançar.

- O Grupo de Gestão Integrada criou uma comissão de delegados para concluir 3.144 inquéritos policiais pendentes. O que o senhor acha disso?

Coronel Amaral – Não justifica de maneira nenhuma tantos inquéritos policiais arquivados. O Grupo da Justiça está dando uma contribuição muito grande à segurança pública no Estado, esse grupo da Justiça está ajudando muito à polícia.

- O senhor considera o confronto no combate à criminalidade inevitável?

Coronel Amaral – O Estado tem de mostrar pulso forte no combate à criminalidade, porque a polícia só se faz respeitar pelas suas ações enérgicas. Não digo que o confronto é inevitável, porque se o marginal não reage, se ele se entrega sem reação deve receber o tratamento respeitoso e humanitário. Mas, se o marginal reage à prisão o policial não vai morrer. É a questão do salve-se quem puder. O policial só se faz se respeitar pela maneira correta como ele age. Veja o que está acontecendo no Rio de Janeiro. Se eles há dez anos tivessem feito o que estão fazendo agora, não teríamos chegado ao nível de violência que chegamos.

- Vivemos então os efeitos da carência de autoridade?

Coronel Amaral – Não posso fazer nenhum juízo de valor nesse sentido. Não digo que existe carência de autoridade, porque não estou lá, não estou vivenciando o Estado. Acho que o secretário de Segurança (general Sá Rocha) deve receber mais apoio.

- O senhor não acha que o secretário, sendo de fora, tem mais dificuldade para resolver o problema?

Coronel Amaral – Qualquer um que venha de fora terá problemas, porque quando for tomar pé da situação demanda tempo. O secretário tem de formar a sua equipe.

-Os taxistas de Maceió pedem sua volta ao comanda da Segurança Pública. Por que eles precisam tanto do senhor?

Coronel Amaral – Acredito que eles (taxistas), na época em que fui secretário de Segurança, tiveram menos constrangimentos por parte dos marginais. Eu sempre apoiei os taxistas e todas as outras categorias de profissionais. Não estou dizendo que isso não esteja sendo feito hoje. O secretário que está aí tem condições, se está no cargo é porque é capaz. O governador é quem escolhe seus subordinados e se escolheu o general (Sá Rocha) é porque ele tem condições de exercer a função.

- Mas, na sua época os presos desapareciam...

Coronel Amaral – Não, não desapareciam não. Mas, se reagissem é aquela história: o policial ia morrer? O marginal que reagia não tinha vez.

-Quando se denunciava as mortes, os sumiços de pessoas na sua gestão o senhor certa vez afirmou que nenhum homem de bem foi desmoralizado na sua administração. O senhor continua pensando assim?

Coronel Amaral – Continuo. Nenhum homem de bem foi desmoralizado, pobre ou rico, e todos que procuravam a Secretaria de Segurança durante minha gestão eram atendidos, nunca deixei de atender a ninguém independente da condição social.

- O senhor construiu o Presídio Agrícola Santa Fé, considerado modelo pela Organização das Nações Unidas, mas que nunca funcionou. O que houve com a Santa Fé?

Coronel Amaral – Não sei. Alguma coisa grave aconteceu e deveria ser apurado. O Presídio Santa Fé não foi inaugurado porque eu fui demitido. Trinta dias antes da inauguração me demitiram. O presidente da República ( na época o general Ernesto Geisel) tinha sugerido convidar todos os secretários de Segurança do País para conhecerem o que estávamos fazendo em Alagoas, para conhecerem a Santa Fé, presídio modelo considerado pela ONU (Organização das Nações Unidas), e o Manicômio Judiciário. Infelizmente, a Santa Fé nunca funcionou e o Manicômio Judiciário não sei como está.

- O senhor não visitou mais o projeto?

Coronel Amaral – Não, não visitei não. Quando saio de um lugar eu costumo não voltar lá que é para não constranger os que estão lá, constranger os que ficaram lá.

- E sobre as fugas de presos? Ocorreram fugas de presos na sua gestão?

Coronel Amaral – Nunca houve fugas de presos na minha época. E muitos presos viviam soltos, soltos mesmo. Todos os dias saiam dois caminhões de presos para limparem a orla da Pajuçara, a orla de Maceió, e a Prefeitura pagava um salário-mínimo para cada preso. Om preso recebia metade e a outra metade ficava num fundo para quando saísse da cadeia, quando cumprisse a pena, tivesse algum dinheiro e não morresse de fome. E nenhum deles fugiu. Os canaviais em torno do presídio eram cuidados pelos presos. O preso que entendia de cana-de-açúcar cuidava do canavial, ganhava dinheiro e ninguém fugiu. Minha esposa (dona Sônia Amaral) cuidava da parte recreativa, com peças de teatro e outras atrações culturais, e nunca houve rebelião, nunca houve ameaças nem fugas. O mesmo acontecia no Manicômio Judiciário, minha esposa fazia um trabalho lá. Lembro-me sw que no Natal havia o pastoril, organizado por minha esposa e pela irmã Jacinta, e ninguém nunca impediu que o pastoril se apresentasse, que as meninas dançassem.

- Coronel, o senhor trocaria a tranqüilidade da vida na fazenda pela agitação de Maceió? Ou seja: o senhor aceitaria ser novamente secretário?

Coronel Amaral – Olha, se eu recebesse o convite pensaria duas vezes. Eu iria analisar. Se me fosse dada as condições de trabalho para que eu pelo menos pudesse fazer com que a Secretaria voltasse à situação que deixei, eu iria pensa.

- E que condições seriam essas?

Coronel Amaral – (risos) Ah! Isso não posso dizer. Mas, acho que deve existir a união de todos os poderes para o combate à criminalidade. Na minha época havia essa união, esse interesse.

com tudonahora.com.br // blog do bob



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