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Mundo
06/02/2022 16:00:00

Se ataque russo não é iminente, por que Ucrânia pede armas?

EUA disseram que não vão mais se referir a uma possível invasão russa à Ucrânia como "iminente" após reclamações do governo de Kiev. Mas Ucrânia segue pedindo ajuda de aliados para receber armas. Por quê?


Se ataque russo não é iminente, por que Ucrânia pede armas?

Há semanas, o mundo acompanha o desenrolar das tensões entre a Ucrânia e a Rússia. Os Estados Unidos chegaram a classificar um ataque de Moscou a Kiev como "iminente". O governo ucraniano tentou colocar panos quentes e acalmar a população, mas, ao mesmo tempo, recebe líderes ocidentais e pede o envio de armas. Se um ataque russo não é provável em curto prazo, por que a Ucrânia está pedindo ajuda e recebendo armas?

Moscou estacionou cerca de 100.000 soldados próximos às fronteiras com a Ucrânia, aumentando as especulações de que poderia invadir o país vizinho. Em 2014, a Rússia anexou a península ucraniana da Crimeia ao seu território.

O governo dos EUA alerta que esse número de soldados pode rapidamente aumentar para 175.000. Analistas de inteligência ocidentais dizem que as tropas estão cada vez mais de posse da logística necessária para lançar um ataque, incluindo suprimentos de sangue para hospitais de campanha russos perto da fronteira com a Ucrânia. Ao mesmo tempo, a Rússia está realizando exercícios conjuntos em Belarus, envolvendo 30.000 soldados, estima a Otan.

Em resposta, a Ucrânia solicitou e começou a receber armas de países ocidentais nas últimas semanas: sistemas antitanque dos EUA e do Reino Unido, além de munições e mísseis antiaéreos dos Estados Bálticos. A União Europeia (UE) prometeu mais de 1 bilhão de euros em assistência.

A questão central é se isso é apenas uma atitude precipitada do presidente russo, Vladimir Putin, em uma tentativa de chamar a atenção do Ocidente para sua exigência de que a Ucrânia nunca seja autorizada a ingressar na Otan ou se o líder da Rússia realmente pretende lançar um ataque à Ucrânia. E se houver de fato um ataque, se isso tomaria a forma de uma intervenção localizada ou uma invasão em grande escala.

Críticas da Ucrânia aos EUA

Em 2 de fevereiro, a secretária de imprensa da Casa Branca, Jen Psaki, anunciou que o termo "iminente" não seria mais usado para descrever a ameaça de uma intervenção russa. Não porque a avaliação objetiva da inteligência americana tenha mudado, mas porque o termo pode inadvertidamente sugerir certeza dos EUA sobre as intenções de Putin. O uso do termo e a retórica dura do governo de Joe Biden também causaram atritos significativos com o governo ucraniano.

"Sou o presidente da Ucrânia e estou aqui no terreno, acho que entendo os detalhes melhor do que qualquer outro presidente", foi a mensagem do presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, a jornalistas estrangeiros que lhe pediram para explicar a lacuna entre as mensagens dos EUA e a linha mais cautelosa de seu governo.

Enquanto Washington alertava sobre a ameaça aguda de invasão russa, Zelensky disse aos ucranianos que os riscos não eram maiores do que antes. Tudo o que mudou, afirmou Zelensky, foi o aumento repentino da atenção da mídia internacional.

A declaração do presidente ucraniano foi ainda mais surpreendente porque os líderes do país, incluindo o próprio Zelensky, passaram anos pedindo ao Ocidente que não subestimasse a ameaça representada pela Rússia à independência da Ucrânia. Não apenas isso: Kiev reuniu uma impressionante lista de desejos de sistemas de armas ocidentais que diz precisar para impedir que a Rússia ataque.

As diferenças entre Kiev e Washington são mais sobre "a estilística e a ênfase" do que qualquer outra coisa, argumentou o cientista político Volodymyr Fesenko. Ele destacou que, desde a anexação da Crimeia pela Rússia em 2014, Moscou aumentou sua presença militar permanente ao longo das fronteiras da Ucrânia e realizou exercícios em larga escala toda primavera e verão europeus. Como resultado, os ucranianos, explica Fesenko, aprenderam a conviver com o risco constante de escalada.

Toda a conversa atual sobre um ataque já teve um impacto muito real na Ucrânia. "A guerra ainda não estourou, mas a guerra já está sendo travada na mídia, e isso está tendo um impacto negativo na economia ucraniana”, disse Fesenko à DW.

Como as escaladas anteriores foram resolvidas?

Esta não é a primeira vez que a Rússia usa movimentação de tropas para aumentar as tensões com a Ucrânia. Em março e abril de 2021, a Rússia reuniu dezenas de milhares de soldados nas fronteiras ucranianas e realizou exercícios da Marinha no Mar Negro.

A movimentação causou preocupação internacional, mas os temores de um conflito iminente eram menos agudos do que no momento. Naquela época, as forças russas não tinham a logística para lançar um ataque em grande escala e a Rússia não havia formulado nenhuma demanda concreta.

Soldados armados e vestindo roupas brancas com manchas pretas treinam em uma estrada com neve. Há um tanque de guerra na foto,
Soldados ucranianos treinam em uma simulação de criseFoto: Mykola Tymchenko/AP/picture alliance

Na primavera de 2021, a oferta de Biden de uma cúpula individual com Putin, o qual ele havia chamado de "assassino" apenas algumas semanas antes, bastou para a Rússia encerrar as manobras.

Agora, a mera oferta de diálogo dificilmente será suficiente para resolver as tensões. A cúpula Biden-Putin em Genebra em junho de 2021 pouco serviu para a Rússia avançar em seus objetivos.

Desta vez, Moscou emitiu uma lista de demandas, incluindo a proibição de a Ucrânia ingressar na Otan e um compromisso da Aliança Atlântica de retirar tropas e equipamentos militares dos estados membros no Leste Europeu. A Otan já descartou atender a qualquer uma dessas exigências.

Isso deixa as conversas sobre o controle de mísseis de alcance intermediário na Europa como a única parte das demandas da Rússia com alguma chance de progresso.

Observadores esperam que qualquer acordo desse tipo sobre controle de armas, mesmo que seja alcançado, provavelmente não seja uma vitória diplomática suficiente para o Kremlin estar disposto a diminuir a escalada.

Quanto a escalada está custando à Ucrânia?

Mesmo sem um único tiro disparado, falar de guerra iminente na Ucrânia já está prejudicando a confiança dos investidores internacionais no país. Essa é parte da razão pela qual o presidente Zelensky está tão interessado em diminuir a retórica.

Até agora, a moeda da Ucrânia, a hryvnia, resistiu bem, perdendo menos de 10% de seu valor em relação ao euro nas últimas semanas - embora isso não tenha acontecido sem a ajuda do banco central, que gastou mais de um bilhão de euros para deter a queda da moeda.

O efeito indireto mais relevante para a economia até agora, diz o analista Sergey Fursa, tem sido a capacidade da Ucrânia de tomar dinheiro emprestado nos mercados internacionais. Na situação atual, os leilões de títulos estariam fadados ao fracasso, explica Fursa.

Evidências estão aumentando de que empresas internacionais estariam deixando de lado planos de investimento na Ucrânia, já que algumas empresas no país estão seguindo o exemplo de algumas embaixadas ocidentais e evacuando funcionários da capital ucraniana.

Quantificar o valor de tais investimentos perdidos é difícil. No entanto, à medida que a escalada atual se desenrola, analistas alertam que a incerteza constante sobre a segurança da Ucrânia pode vir a ser um freio permanente no desenvolvimento econômico do país.

Zelenskiy ao lado de Erdogan. Ambos vestem terno e gravata e usam máscara.
Presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelenskiy, recebe a visita de presidente turco, Recep Tayyip ErdoganFoto: Valentyn Ogirenko/REUTERS

Existe uma vantagem para a Ucrânia?

Em apenas uma semana, os líderes da Turquia, Reino Unido e Holanda visitaram Kiev, com promessas de suprimentos militares. Foi uma demonstração de apoio sem precedentes e algo que a Ucrânia, em tempos normais, celebraria como uma vitória diplomática.

A Ucrânia está verdadeiramente na agenda da Europa e da Otan – por isso, teme que as exigências da Rússia sejam levadas a sério.

A Ucrânia recebeu armas e promessas de entregas futuras não apenas dos Estados Unidos, mas também de outros países da Otan, como o Reino Unido, que anteriormente não fornecera armas letais.

Mas isso não muda o fato de que o valor do equipamento ofertado à Ucrânia ainda é modesto em comparação com o apoio dos EUA para Israel ou para o Afeganistão antes da tomada do Talibã no ano passado.

Quanto à adesão à Otan, a aliança recusou-se a excluir a entrada da Ucrânia, mas também não deu esperanças de uma adesão a curto prazo.

dw.com/pt-br



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