Uma ação coordenada das forças policiais e fiscais resultou na execução de 126 mandados de busca e apreensão em quatro estados brasileiros e no Distrito Federal, visando desarticular um vasto esquema de fraude tributária associado ao Grupo Refit.
A operação recebeu o nome de Poço de Lobato, em referência ao primeiro poço de petróleo perfurado no Brasil, em 1939, na cidade de Salvador.
O grupo, considerado um dos maiores devedores do país, foi inicialmente conhecido como Refinaria de Manguinhos, uma importante companhia do setor de combustíveis que operava exclusivamente no Rio de Janeiro. Com o tempo, a corporação passou por uma transformação de marca e consolidou um conglomerado complexo, composto por holdings e diversas empresas interligadas, com atuação global.
De acordo com informações da Receita Federal, o chefe da operação, Robinson Barreirinhas, afirmou que o Refit deixou de pagar cerca de R$ 26 bilhões em tributos, configurando a maior dívida fiscal do Brasil atualmente. A investigação revelou que o grupo tinha vínculos com outras companhias alvo da Operação Carbono Oculto, deflagrada em agosto passado, também focada no setor de combustíveis. Entre o segundo semestre de 2024 e o início de 2025, as empresas do grupo movimentaram mais de R$ 72 bilhões por meio de diversas estruturas financeiras, incluindo fundos de investimento e offshores, com o intuito de ocultar lucros ilícitos.
Segundo as apurações, o mecanismo de dissimulação financeira era facilitado por uma grande operadora que atuava como uma espécie de matriz, participando de várias sociedades controladas por ela mesma. Essa estrutura complexa tinha como objetivo esconder recursos de origem ilícita, com a PGFN e o Cira/SP bloqueando bens no valor superior a R$ 10,2 bilhões, incluindo imóveis e veículos, como medida de cautela.
Antes da operação de ontem, a Receita também interceptou quatro embarcações que continham aproximadamente 180 litros de combustíveis, suspensos por irregularidades detectadas pela Agência Nacional do Petróleo (ANP). Como consequência, a refinaria do grupo foi interditada por irregularidades na produção e comercialização de derivados de petróleo.
As investigações apontam que o grupo utilizava importadoras terceirizadas, vinculadas a formuladoras e distribuidoras, para lavar dinheiro e sonegar impostos na compra de diesel, nafta e outros hidrocarbonetos de fontes estrangeiras. Desde 2020, o Fisco identificou a entrada de mais de R$ 32 bilhões em combustíveis classificados como "derivados de petróleo para industrialização", mas utilizados na prática como gasolina importada, sem comprovação de processo de refino ou uso de aditivos autorizados.
Além disso, o Refit operava no exterior por meio de empresas offshore, muitas delas registradas em Delaware, nos Estados Unidos—um conhecido paraíso fiscal—que atuavam como sócias ou cotistas, compartilhando os mesmos representantes das empresas brasileiras relacionadas ao grupo. Uma exportadora em Houston, nos Estados Unidos, foi utilizada para importar mais de R$ 12,5 bilhões em combustíveis, enquanto 50 empresas offshore enviaram recursos para adquirir participações e bens imóveis no Brasil, totalizando cerca de R$ 1 bilhão.
Durante entrevista, o secretário da Receita Federal celebrou o sucesso da operação e destacou a colaboração com órgãos como a Polícia Federal e o Ministério Público. Ele ressaltou que, nos últimos meses, cinco navios carregados com derivados de petróleo foram apreendidos após desembarques fraudulentos envolvendo o mesmo grupo, marcando uma novidade: foi a primeira ação da Receita que não foi contestada por liminares judiciais em um longo período.
Barreirinhas comentou que a estratégia adotada, baseada na transparência e na cooperação, permitiu levar rapidamente as informações ao Judiciário, facilitando ações mais eficazes contra os infratores. Ele também anunciou que a parceria entre a Receita e a Polícia Federal deve ser fortalecida após essa operação. "Estamos fechando o cerco daqueles que, nas suas mansões em Miami, na Europa ou no topo das empresas, prejudicam a segurança do Brasil e alimentam a corrupção", declarou.
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, também se manifestou, informando que o grupo Refit possuía uma dívida ativa de impostos de R$ 9,6 bilhões no estado, valor que supera o aumento previsto para os custos do setor de saúde pública em 2025, estimado em R$ 10 bilhões. Ele reforçou que a companhia se especializou em práticas de inadimplência tributária.
O líder do conglomerado, Ricardo Magro, empresário paulistano de 51 anos, reside desde 2016 em uma área nobre de Miami, nos Estados Unidos. Apesar das diversas ações fiscais e disputas judiciais enfrentadas ao longo dos anos, Magro afirma que as acusações de ser o maior devedor de ICMS do Brasil seriam uma perseguição institucional promovida por grandes grupos do setor.
Em relação às medidas propostas, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defendeu a aprovação de um projeto de lei que endurece as punições para empresas reincidentes em sonegação e acredita que a legislação atual é equilibrada, ajudando a distinguir as empresas responsáveis das que agem de má-fé. Haddad também destacou que tem levado ao presidente Lula a necessidade de incluir na agenda negociações bilaterais o combate ao uso de empresas offshore e ao crime organizado, especialmente envolvendo importações de combustíveis, como as realizadas pelo Refit em Houston, que importou mais de R$ 12,5 bilhões em combustíveis.